Imaginando o gráfico de funções de uma variável
Em cálculo aprendemos que as derivadas ajudam a traçar o gráfico de certas funções. Porém, às vezes podemos usar de puro raciocínio para ter uma ideia do gráfico de uma função sem precisar de uma máquina. A ideia geral esta, de fato, se aproveitando do conceito da derivada. Quando você olha para uma equação e quer adivinhar o gráfico sem traçá-lo num computador, o que você deve fazer é pensar em pequenos incrementos no argumento da função. Faça um exercício mental calculando a função para x = 0, x = 1, x = 2 e imagine como a função cresce | decresce para cada unidade que você adiciona ou subtrai. Tente prever o comportamento da função tanto para valores muito grandes quando para os muito pequenos. Mesmo sem saber a definição de derivada, você esta, de fato, aplicando este conceito.
Para conferir os gráficos dos exemplos use o google, desmos, geogebra ou wolfram para traçar os gráficos online.
Antes de continuar, eu estou partindo do pressuposto de que você já sabe traçar o gráfico de senos, cossenos, parábolas, cúbicas, exponenciais e logaritmos.
Adição de funções
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(x) + x^2 }[/math]
Primeiro temos que [math]\displaystyle{ -1 \leq \sen(x) \leq 1 }[/math]. Por outro lado, o quadrado não tem limites, ele pode crescer tanto quanto quiser. Para qualquer ângulo grande em radianos (lembre-se que ângulos são números reais) o quadrado vai produzir um número muito maior do que o seno. Para números grandes concluímos que a parábola domina o gráfico. Poderíamos parar por aqui, mas ainda há uma questão não resolvida: o que acontece com números pequenos? O menor valor para a onda é [math]\displaystyle{ \sen(3\pi/2) = -1 }[/math] e [math]\displaystyle{ (3\pi/2)^2 \gt 1 }[/math]. [math]\displaystyle{ \sen(\pi) = 0 }[/math] e [math]\displaystyle{ \pi^2 \gt 9 }[/math]. A partir destes números temos uma vaga impressão que quando olhamos para [math]\displaystyle{ |\sen(a) - \sen(b)| }[/math] e [math]\displaystyle{ (a - b)^2 }[/math], o segundo deve resultar em números maiores do que o primeiro caso. A partir daí podemos estimar que o gráfico também é uma parábola para números pequenos.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(x) + e^x }[/math]
Este é interessante. Para [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math], temos que [math]\displaystyle{ e^x \lt 1 }[/math] e conforme formos para valores de [math]\displaystyle{ x }[/math] mais negativos, a função se aproxima ainda mais do zero. Por outro lado, a onda do seno continua a sua oscilação períodica entre -1 e 1, o que significa que o seno "ganha" aqui. Agora para [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] vemos que a exponencial cresce numa taxa muito maior do que a amplitude do seno, o que significa que a exponencial "ganha" aqui. Para [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] a exponencial domina o gráfico.
- [math]\displaystyle{ f(x) = e^x - x^2 }[/math]
Este é bastante rápido. Para [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math] o quadrado "puxa para baixo" o gráfico porque a exponencial nunca é negativa. Para [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] a exponencial cresce muito mais rápido, de tal forma que o quadrado não é "forte" o bastante para impedir o crescimento da exponencial. Como sabemos disto? Uma forma é memorizando os gráficos de [math]\displaystyle{ x^2 }[/math] e [math]\displaystyle{ e^x }[/math]. A segunda forma é perguntar: qual é maior [math]\displaystyle{ e^{10} }[/math] ou [math]\displaystyle{ 10^2 }[/math]? Sabemos que [math]\displaystyle{ 2 \lt e \lt 3 }[/math]. A terceira forma é comparando taxas de variação.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(x) + \sen(2x) }[/math]
No domínio da física, adicionar uma onda a outra é chamado de interferência. O gráfico é uma onda "contida" em outra. Neste caso temos dois padrões. Uma onda oscila num intervalo regular, mas dentro do intervalo desta há uma outra oscilação com um intervalo diferente. Dê uma volta completa no ciclo trigonométrico. Veremos que há uma onda e dentro do período desta, uma outra onda com frequência maior, no mesmo ciclo.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(x) + x }[/math]
Considere a distância entre duas funções, sob a restrição de uma oscilação para o seno, desta forma [math]\displaystyle{ |\sen(x) - x| = d }[/math]. Sabemos que o seno é uma onda e a função identitdade é uma linha reta. O que vai acontecer com a distância conforme aumentamos ou diminuímos a variável de entrada? O seno produz valores diferentes, mas a identidade sempre produz o mesmo valor, igual ao de entrada. Qual a conclusão então? Que a distância entre as duas oscila sempre entre dois extremos. Portanto temos o seguinte cenário [math]\displaystyle{ x + d \lt f(x) \lt x - d }[/math]. Conclusão? O gráfico desta função é uma onda contida entre duas linhas retas [math]\displaystyle{ x + d = y_ 1 }[/math] e [math]\displaystyle{ x - d = y_2 }[/math].
A outra forma de resolver isto é complicada. Faça uma tabela de valores para [math]\displaystyle{ x }[/math], [math]\displaystyle{ \sen(x) }[/math] e [math]\displaystyle{ \sen(x) + x }[/math]. Escolha ângulos que sejam múltiplos de [math]\displaystyle{ \pi }[/math] radianos. Você irá notar alguns padrões na tabela. Se você pegar incrementos em [math]\displaystyle{ x }[/math] numa taxa constante, há um padrão. A função parece se comportar como se fosse uma linha reta. Porém, se você pegar incrementos que não sejam constantes, notará algo diferente. A função se comporta como se fosse uma onda. Como pode uma função se comportar como uma onda e uma linha reta ao mesmo tempo? Há somente uma possibilidade que é uma onda seguindo o caminho da uma linha reta. Vê? Adicione uma constante [math]\displaystyle{ c }[/math] a uma onda, o gráfico se desloca para cima ou para baixo por esta constante. A constante nada mais é do que uma função constante. O que acontece se pegarmos a função constante e girá-la ou incliná-la de tal forma que continua sendo uma linha reta, mas agora com um ângulo não nulo? Agora a onda também será inclinada / girada.
Pense na expressão para [math]\displaystyle{ f(x) }[/math]. Primeiro, o [math]\displaystyle{ x }[/math], quando comparado com [math]\displaystyle{ x^2 }[/math], não altera o grau da função. O [math]\displaystyle{ x }[/math] não esta deformando o gráfico porque ele tem uma taxa de variação constante. Podemos dar passos constantes e verificar que tudo que o [math]\displaystyle{ x }[/math] faz ali é deslocar um ponto do gráfico para cima ou para baixo por algumas unidades. Isto deve dar uma vaga ideia de que o gráfico será uma onda, porém não mais perfeitamente horizontal e paralela ao eixo x. Por outro ponto de vista. Se espremermos o gráfico verticalmente, estaremos amortecendo as oscilações até o ponto em que a onda essencialmente perde as oscilações e se transforma numa reta. De fato, há casos onde temos algo que oscila com o tempo. Porém, a oscilação é tão diminuta que podemos desconsiderá-la e aproximar o fenômeno por uma linha reta.
Funções compostas
- [math]\displaystyle{ f(x) = e^{\sen(x)} }[/math]
O que temos é o seguinte [math]\displaystyle{ e^{-1} \lt f(x) \lt e^1 }[/math], porque os extremos da direita e da esquerda são, respectivamente, o maior e o menor valor para o seno. Entre os extremos sabemos que [math]\displaystyle{ x^0 = 1 }[/math] para todo [math]\displaystyle{ x \neq 0 }[/math]. Também sabemos que 1/e é um número positivo. Portanto, o gráfico desta função deve ser uma onda onde [math]\displaystyle{ f(x) \gt 0 }[/math] para qualquer [math]\displaystyle{ x }[/math]. Uma nota adicional aqui: é bem difícil prever o quão suave / abrupto a onda será apenas com este exercício mental. Precisamos de mais informações e mais cálculos para isto.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(e^x) }[/math]
Este aqui é bastante fácil. O que acontece quando [math]\displaystyle{ x }[/math] vai para negativo? A exponencial decresce e conforme nos aproximamos do infinito negativo, o valor da função tende a zero. [math]\displaystyle{ \sen(0) = 0 }[/math], o que significa que para [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math] o gráfico esta decrescendo naquela direção. Agora para [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] a expencial continua crescendo para sempre e cada vez mais rápido. O que esta aconecendo com a oscilação do seno? Esta oscilando ainda mais rápido! Conforme caminhamos para o infinito positivo, o período de oscilação se torna tão próximo de zero, que a onda é espremida até o ponto de parecer quase um retângulo sólido num programa de computador.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sen(\sqrt{x}) }[/math]
A raiz não aceita números negativos. Isto significa que o gráfico não vai existir para todo [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math]. Já para [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math], a raiz continua aumentando, porém numa taxa menor do que a função identidade. Já podemos presumir que o gráfico será uma onda, porque para todo [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] o seno calcula algo entre -1 e 1. Podemos parar a nossa análise por aqui. Se quisermos ir além podemos pensar na parábola, que é o inverso da raiz quadrada. Quando aumentamos a entrada, a parábola cresce ainda mais rápido. A raiz quadrada é o contrário. Ela também cresce, mas para entradas cada vez maiores a taxa de crescimento decai cada vez mais. Sem a raiz quadrada o período de oscilação é constante. Porém, a raiz quadrada calcula a raiz do número, o que resulta em períodos de oscilação cada vez mais longos. Em outras palavras, estamos esticando a onda ao longo do eixo x.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \sqrt{\sen(x)} }[/math]
Para [math]\displaystyle{ 0 \lt x \lt \pi }[/math] o seno produz números positivos. Na outra metade do ciclo trigonométrico, [math]\displaystyle{ \pi \lt x \lt 2 \pi }[/math], o seno produz números negativos. Neste intervalo a raiz quadrada não terá um gráfico. Haverão buracos no gráfico da função. A partir daqui podemos ver que o gráfico vai oscilar entre 0 e 1. O formato do gráfico será uma onda onde ignoramos todos os [math]\displaystyle{ f(x) \lt 0 }[/math] e para todo [math]\displaystyle{ f(x) \gt 0 }[/math] é um seno distorcido.
- [math]\displaystyle{ f(x) = e^{-x^2} }[/math]
Primeiro, o que acontece quando [math]\displaystyle{ x = 0 }[/math]? [math]\displaystyle{ f(0) = 1 }[/math]. Sabemos que a função não vai ultrapassar este valor. Como? Porque o argumento da exponencial é uma parábola invertida, o que significa que para qualquer [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math] ou [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math] a função nunca vai ultrapassar o pico de 1. Agora [math]\displaystyle{ e^{-x^2} = 1/e^{x^2} }[/math] significa que quando nos aproximamos de [math]\displaystyle{ +\infty }[/math] ou [math]\displaystyle{ -\infty }[/math] a função se aproxima de zero. Sabemos que esta função não pode crescer ou decrescer a uma taxa constante. A função deve estar relacionada de alguma forma com uma parábola. O que acontece quando [math]\displaystyle{ 1 \lt x \lt 0 }[/math]? Temos frações. Neste caso estamos pegando o inverso da raiz de [math]\displaystyle{ e }[/math]. O que acontece quando [math]\displaystyle{ x \lt 0 }[/math] and [math]\displaystyle{ x \gt 0 }[/math]? Temos que o quadrado cresce cada vez mais rápido. O que sabemos sobre os gráficos de [math]\displaystyle{ \sqrt{x} }[/math] e [math]\displaystyle{ x^2 }[/math]? Uma é o inverso do outro. A taxa de variação da raiz decresce com o tempo. O quadrado é o contrário, a taxa cresce com o tempo. Isto deve nos dar a ideia de que a taxa de variação, de alguma forma, inverte de sinal em algum ponto entre o infinito e o pico da função. Que tipo de forma relaciona-se com o comportamento recém mencionado? Uma onda, que não se encaixa aqui. Uma combinação de parábolas com concavidade para cima e para baixo, o que não parece funcionar com o expoente que temos. Ou, algo como um "S", que é o que acontece aqui. Esta função tem o formato de "boca de sino".
Produto de funções
- [math]\displaystyle{ f(x) = x^2 \sen(x) }[/math]
Isto é bem diferente da adição. O seno continua uma onda, mas a parábola também faz parte do gráfico desta função. Como pode uma função ser uma parábola e uma onda ao mesmo tempo? É parecido com [math]\displaystyle{ \sen(x) + x }[/math], o que daria numa onda seguindo o caminho de uma parábola? Não exatamente. É muito mais simples do que aquilo. Para cada entrada, estamos multiplicando a onda pelo quadrado do mesmo número. Em outras palavras, com o tempo estamos aumentando a amplitude da onda cada vez mais. Não estamos calculando o quadrado do argumento da função, o que resultaria numa frequência de oscilação do seno cada vez maior. Estamos mudando a amplitude do seno, fazendo-a crescer com o tempo. Um comportamento semelhante é observado com [math]\displaystyle{ e^x \sen(x) }[/math].
- [math]\displaystyle{ f(x) = x \sen(x) }[/math]
Isto é bastante semelhante ao caso anterior, exceto que estamos aumentando a amplitude numa taxa constante. Não aumentando a amplitude na "velocidade" de crescimento de uma parábola.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \frac{\sen(x)}{x} }[/math]
Agora estamos efetivamente amortecendo a onda com o tempo. No lugar de aumentar a amplitude com o tempo, estamos diminuindo-a. Isto ocorre em ambas as direções, para à direita e para à esquerda da origem. Porém, o que fazemos com a origem? 0/0 é indefinido. A função esta crescendo, decrescendo ou o quê? [math]\displaystyle{ 1/x }[/math] é indefinido na origem. Se você sabe limites, [math]\displaystyle{ 1/x }[/math] vai para [math]\displaystyle{ +\infty }[/math] ou [math]\displaystyle{ -\infty }[/math] dependendo de qual lado é feita a aproximação na direção da origem. Não podemos fazer [math]\displaystyle{ 0 \cdot \infty = 0 }[/math]. Podemos tentar adivinhar. [math]\displaystyle{ \sen(\pi/2) = 1 }[/math]. Se tomarmos [math]\displaystyle{ \pi/2 }[/math] e dividirmos por 10, [math]\displaystyle{ 0.1 \lt \sen(\pi/20) \lt 0.2 }[/math] com [math]\displaystyle{ 0.1 \lt \pi/20 \lt 0.2 }[/math]. De posse destes resultados podemos ter uma boa ideia de que ao aproximarmo-nos do 0°, a razão [math]\displaystyle{ \sen(x)/x }[/math] parece se aproximar da constante 1. Se este for o caso, então na origem, a função não esta indo para mais ou menos infinito como o termo [math]\displaystyle{ 1/x }[/math] nos faria acreditar.
- [math]\displaystyle{ f(x) = \log(x) \sen(x) }[/math]
O log cresce com o tempo. Estamos essencialmente aumentando a amplitude da onda, mas com uma taxa que é cada vez menor com o tempo. O efeito oposto de multiplicar por [math]\displaystyle{ x^2 }[/math] ou [math]\displaystyle{ e^x }[/math]. Para [math]\displaystyle{ x \leq 0 }[/math] a função é indefinida por causa do log.